segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O CADE e as fusões e aquisições

Um dos assuntos mais comentados ultimamente por aqueles que atuam em fusões e aquisições diz respeito às recentes alterações na legislação brasileira de defesa da concorrência, as quais entrarão em vigor em 30 de maio deste ano. Dentre uma série de mudanças, duas delas são de especial importância para aqueles envolvidos com o assunto: os critérios que determinam a obrigaçãode submeter atos de concentração à apreciação das agências brasileiras de Defesa da Concorrência e o momento em que referida notificação deverá ocorrer.

Com relação ao primeiro ponto, a lei atual estabelece que operações em que qualquer um dos participantes tenha registrado faturamento bruto anual, no Brasil, equivalente ou superior a R$ 400 milhões, ou que impliquem em participação superior a 20% de determinado mercado relevante, sejam submetidos à aprovação dos órgãos concorrenciais. Já a nova sistemática excluiu o critério de mercado relevante, estabelecendo apenas a obrigação de notificação nas operações em que um dos grupos envolvidos possua faturamento  bruto anual, no Brasil, igual ou superior a R$ 400 milhões; e o outro grupo envolvido também tenha tido, no Brasil, faturamento bruto anual de pelo menos R$ 30 milhões.

Essa mudança de critério representa, em nossa opinião, um importante avanço, pois reduzirá significativamente o número de atos de concentração submetidos à análise das agências concorrenciais, possibilitando uma alocação mais eficiente dos escassos recursos de que o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência dispõe. Além disso, é praticamente consenso entre aqueles envolvidos com Fusões e Aquisições que a exclusão do critério de marketshare é necessária, principalmente pela dificuldade enfrentada pelas empresas em mensurar a participação que detêm em seu respectivo mercado de atuação.

A segunda — e não menos relevante — mudançaestabelece a obrigatoriedade de apresentação prévia dos atos de concentração às Agências Brasileiras de Defesa da Concorrência. Hoje em dia, o prazo é de até 15 dias úteis, contados da assinatura do primeiro instrumento vinculante celebrado entre as partes. Com a nova lei, tal notificação deverá ocorrer previamente ao fechamento da operação. Essa obrigatoriedade de apresentação prévia dos atos de concentração fará com que as operações não possam ser realizadas sem antes terem sido aprovadas pelas autoridades concorrenciais. O descumprimento a tal exigência sujeitará a empresa a multa, cujo valor poderá variar de R$ 60 mil a R$ 60 milhões, e a operação será considerada nula.

Esta alteração tem certamente um aspecto positivo, qual seja o de impedir que operações já consumadas tenham que ser desfeitas, como ocorreu no emblemático episódio da fusão entre Nestlé e Garoto, até hoje pendente de solução. Por outro lado, porconta de um veto da presidente Dilma Rousseff ao sancionar a nova lei, foi suprimido um importante artigo, que determinava que se o prazo máximo de 330 dias que o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) teria para julgar a operação fosse descumprido, o negócio seria automaticamente aprovado. Em nosso entendimento, a supressão deste dispositivo — feita sob a alegação de que tal mecanismo de aprovação automática seria por demasiado arriscado — acabará por gerar enorme insegurança jurídica entre as partes envolvidas, as quais simplesmente não saberão até quando terão que esperar para concretizar o negócio. Vale lembrarque muitas Fusões e Aquisições são motivadas pela possibilidade de ganhos de escala e maior eficiência administrativa depois da conclusão do negócio, de forma que a excessiva demora na análise da operação poderá gerar perdas significativas para as partes envolvidas.

O tamanho do problema gerado com a obrigatoriedade de notificação prévia desprovida de um prazo máximo de análise dependerá quase que exclusivamente da capacidade das Agências Brasileiras de Defesa da Concorrência de responder com agilidade às operações aelas submetidas, fato esse, por sua vez, intrinsecamente ligado ao tamanho das verbas que serão destinadas ao novo Cade para exercer o seu papel neste novo cenário.



domingo, 29 de janeiro de 2012

Trabalhador pode optar por ajuizar ação onde prestou serviço ou onde o contrato foi celebrado

A 4ª Câmara do TRT deu provimento ao recurso do reclamante, declarando a competência da 1ª VT de Araraquara para instruir e julgar a ação que ele moveu contra o grupo de empresas para o qual trabalhou.
O autor tinha ajuizado em 2006 a reclamação trabalhista em Araraquara, cidade onde reside, em face da empresa de assessoria empresarial, que o contratara para prestar serviços numa indústria de papel e celulose, nas cidades de Mucuri e Camaçari, na Bahia, e em Pitumbu, na Paraíba. Outras duas empresas foram igualmente arroladas como reclamadas: uma do ramo de construção e outra do ramo também de papel e celulose, formando todas um grupo econômico.
Duas das reclamadas apresentaram exceção de incompetência, argumentando que a prestação de serviços ocorrera na cidade de Camaçari, na Bahia. O juízo de primeiro grau acolheu a exceção de incompetência, determinando a remessa dos autos para uma vara do trabalho com jurisdição sobre a cidade de Camaçari.
O trabalhador, em seu recurso, disse que reside em Araraquara (onde, segundo ele, o contrato se efetivou), e alegou que não tinha condições de se deslocar para a Bahia, para onde foi determinada a remessa dos autos.
A Câmara reconheceu que o serviço foi prestado fora de Araraquara, mais especialmente na Bahia e na Paraíba. A controvérsia restringiu-se, porém, ao local da contratação, tendo em vista que, segundo o reclamante, esta ocorreu em Araraquara, e, segundo a primeira reclamada, em Barueri, local onde se encontra a sede da empresa. A única testemunha ouvida informou que, “juntamente com o autor e os demais empregados, fizeram exames médicos admissionais na cidade de Araraquara” e que “todos foram levados para uma cidade próxima a Jundiaí, onde formalizaram o contrato e, dali, seguiram, de kombi, até o posto de trabalho, no Estado da Bahia”.
A relatora do acórdão, desembargadora Rita de Cássia Penkal Bernardino de Souza, lembrou que, “no processo do trabalho, a regra de competência em razão do lugar regula-se pelo artigo 651 da CLT, que estabelece, como regra, o local da prestação de serviços”, mas ressaltou o parágrafo 3º do mesmo artigo, que, “visando facilitar o acesso ao Judiciário, faculta ao empregado o direito de reclamar seus direitos no local da celebração do contrato ou onde exerceu suas atividades”. Segundo a decisão colegiada, “no direito do trabalho, a análise de situações como a que ora se aprecia deve fugir aos rigores da literalidade da lei, aproximando-se mais do princípio maior do acesso ao Judiciário, bem como daqueles que norteiam o processo do trabalho: o da proteção e o da condição mais benéfica ao empregado, hipossuficiente na relação laboral”. O acórdão frisou que “o próprio ordenamento jurídico prevê mecanismos para garantir a isonomia do trabalhador em relação ao empregador, na medida de suas respectivas desigualdades, não havendo falar em privilégios processuais ao obreiro”.
Por isso, e também baseada em decisão do Tribunal Superior do Trabalho, a Câmara deu preferência ao juízo da localidade “mais acessível ao trabalhador para reclamar os direitos que entende devidos”.
No entendimento colegiado, “impor ao trabalhador deslocar-se para outro Estado para exercer seu consagrado direito de ação seria o mesmo que lhe inviabilizar a garantia do acesso à Justiça, tendo em vista os notórios obstáculos com que iria deparar-se, especialmente os problemas de ordem econômico-financeira, sem falar nas questões pessoais, familiares e de trabalho, o que, sem dúvida, revelar-se-ia um verdadeiro contrassenso”.
E concluiu que “os elementos de prova constantes dos autos apontam que o recrutamento ou a contratação do autor – e de inúmeros colegas – ocorreu na cidade de Araraquara, onde todos residiam/residem, sendo o contrato apenas formalizado em Barueri”. (Processo 0000983-90.2010.5.15.0006)

Ademar Lopes Junior